07 Setembro 2008
No Último Filme da Saga Indiana Jones, John Hurt tem uma das falas mais idiotas de toda a sua carreira - quando a espaçonave dos extraterrestres (sim, tem espaçonaves, sim, tem extraterrestes, não se preocupem com este spoiler pois é um desenlace que qualquer espectador atento ou ainda acordado conseguirá antever logo desde o primeiro acto) levanta vôo e um dos personagens lança a pergunta que mereceria o olhar reprovador de imbecilidade de qualquer pessoa, «Será que vão para o espaço?», Hurt no papel de um professor arqueólogo alucinado (o enredo tenta convencer-nos que se deve aos efeitos de uma caveira de cristal alienígena com poderes psíquicos, mas eu desconfio que se tratará de um comentário subtil aos efeitos secundários das políticas do nosso Ministério da Educação) lança este maravilhoso repto, «Não, vão para o espaço entre os espaços»... (por outro lado, aplicar a observação em causa à lógica de raciocínio do referido Ministério explicaria muita coisa) - seguida surpreendentemente de uma das melhores - quando Indy reencontra e se casa finalmente com a sua antiga paixão, da qual se separara muitos anos antes, implicando assim o retomar de uma vontade interrompida, Hurt comenta «Tanto que se perde de uma vida humana à espera...».De resto, uma história banalíssima, que merece ser esquecida e de facto rapidamente o é, seguindo a herança do segundo e o terceiro filmes da saga, os quais nunca conseguiram chegar aos calcanhares do primeiro, embora o desastre, neste, tenha sido maior. Poderia discorrer como outros colegas na internet sobre as ligações desta história com as raízes do pulp, não fosse ter ficado com a sensação de que o filme era uma private joke de rapazes crescidos, nos seus cinquenta e sessenta anos, despretenciosos e com vontade de se divertirem mais um pouco, e não um retomar de uma tradição narrativa nem uma homenagem a tempos antigos como foi o primeiro filme (de acordo com entrevistas de Spielberg de então) nem sequer uma necessidade de manter a coerência temática do mundo Indiana Jones (desde logo comprometida com a evidência física de um castigo divino no primeiro filme, misturando-se a fantasia mundana com a fantasia religiosa de uma forma que já não se encontra muito nos laicos tempos actuais).
Melhor expressão da existência na terceira idade é Duma Key, uma das mais recentes obras de Stephen King e que por sinal tenho estado a apreciar, apesar das minhas ressalvas relativamente ao que o mestre do horror costuma verter em formato romance. Um estilo solto, menos carregado dos tiques habituais, uma quase perfeição na medida em que vai soltando os pequenos indícios da trama narrativa, um bom controlo dos personagens, este é Stephen King desnudando a forma de pensar e conviver de personagens que já passaram o seu primor, imperfeitas, idosas, assoladas pelas maleitas dos anos acumulados, dos azares e dos erros do passado. Se fizer juz ao que conheço dos romances dele, King irá desiludir-me mais adiante, ele que sempre foi um excelente tecedor de teasers e promessas, antes de as espatifar com finais pouco imaginativos e inócuos. Quase desejo que prolongue a introdução dos elementos fantásticos, que se mantenha enraizado numa história de filosofia humana até não poder mais, que não se distraia das relações entre pais, filhos e estranhso, e a necessidade de se reencontrar um rumo da vida perante a tragédia, que neste livro estão tão bem retratados. Mas, claro, encontramo-nos na chamada «ficção de género», e noblesse oblige, ou mais certamente obrigará o cheque, o fantástico entrará nesta casa com as patorras enlameadas, para salvar o mundo de acabar amanhã se ao mestre, ó Horror dos Horrores, desse na tola escrever mainstream...