Exposição Prolongada à Ficção Científica  

   um blog de Luís Filipe Silva


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11 Junho 2016

Por ocasião do lançamento da Cidade da Carne, surgiu um conjunto interessante de críticas em jornais - nenhuma delas online - que, pela ocasião do relançamento, lembrei-me de começar a transcrever. Os jovens não saberão, mas houve um tempo em que os jornais eram lidos, eram relevantes, originavam debates virais e, com certos suplementos, convidavam ao arquivo.

O primeiro é do Diário do Alentejo, do dia 3 de Setembro de 1993. Os negritos estão no texto original.

Com os seus lexemas e estruturas sintáctico-estilísticas, seu jogo de significantes e significados, a língua materna é a grande medianeira onde o espírito dá réplica ao real ou, neste caso, ao transreal, porque a palavra ao mesmo tempo grava e transforma, encruzilhada do passado e do «futuro», do social e do individual, dos mitos de uma ideia que se «projecta», e de uma metáfora que se funde com a nebulosa, onde o homem entra quando pretende encontrar sentido para as coisas.

«Quando da publicação de O Futuro à Janela (Prémio Caminho 1991), a crítica foi unânime em salientar que Luís Filipe Silva constituía, pelo menos, uma nítida promessa. Pois a promessa aqui está neste livro A GalxMente, desdobrado em dois tomos que se podem ler autonomamente. A Cidade da Carne é o primeiro painel, completo como tal, deste empreendimento impressionante e por vezes cruel.»

Uma cidade de máquinas e para máquinas ou, melhor paramáquinas quer de métodos de controlo (bio-feedback, etc) quer de um sistema de diálogos psicanalíticos.

Talvez que este futuro ou este viver no futuro mais não seja que uma explicação do normal, quer dizer os meios electrónicos permitem quantificar o comportamento social.

Há no texto uma lógica - o que me parece importante.

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29 Maio 2016

Demorou cerca de 18 meses, a tecelagem desta novela, cujo título áspero ao paladar emergiu da biografia ficcionada de um dos muitos autores de Ficção Científica que Portugal nunca teve (sendo de longa data a inclinação para inventar mundos em que a cultura lusitana reluzia de volumosos tomos de aventuras espaciais e futuristas com referências bibliográficas a um passado de revistas e tertúlias, em jeito de oposição passiva ao mundanismo flatulento da vasta maioria da nossa presente literatura – treino que veio a dar frutos neste outro projecto) e cujo enredo se revelou na primeira linha de um texto que foi preciso iniciar para retirar o título incómodo do pensamento – a linha onde nasceu a Cidade da Carne, toda a sua ascenção e queda. Há livros que se oferecem como uma manhã primaveril, falam de promessas e percursos. Parti-lo a meio foi uma vicissitude necessária, embora talvez entregue com pouca luta. Sem dúvida que contribuiu para fazer de 1993 o ano da FC portuguesa, que entretanto o tempo decorrido já devia ter suplantado. Entretanto, houve quem recensionasse o(s) livro(s), entre eles o João Barreiros com uma crítica inolvidável no Público (quando ainda era possível falar de livros em jornais e criar impacto na comunidade). Houve quem propusesse a sua tradução para inglês, ideia que não avançou. Acabou obviamente por desfazer-se no ar, destino inevitável para as pequenas edições da História, que talvez uma atempada dedicação (fé?) por parte do autor no ofício tivesse salvado. Entre promessas e tentativas de reedição, vinte e três anos decorreram até surgir a oportunidade – mas ei-la, finalmente, recuperada literalmente das cinzas, com uma capa distante do minimalismo da edição original, e inteira. Ininterrupta. Imagem tardia do livro que teria existido no final do século XX? Em grande parte, sim, excepto na percepção entretanto ganha de que andrajava imperfeitamente, frases confusas e laivos de ingenuidade (juvenil?) à mistura com plot points e twists of fate que lhe dão osso e carne. Na separação dos siameses, foi preciso costurar remendos ao final do Cidade da Carne e ao início do Vinganças – além de frases dispersas de contextualização -, que o historial veio revelar insuficiente por parte de quem leu na sequência inversa. Aqui fez-se o contrário, mas um dos remendos foi mantido, porque o livro ficaria mais pobre sem ele. Incluiram-se outras explicações e voltas de sentido, o mais contidas possível para não estragar o conjunto: não cabe aos (semi-)velhos opinar sobre os jovens nem contrariar-lhes a ambição. O livro ficou mais aprumado, mas mantém imperfeições e (se os tiver) todos os êxitos que, para bem ou para o mal, são próprios da sua natureza... excepto num pormenor muito subtil que deixarei para quem se interessa por dissecação narrativa.

Não podia, contudo, nascer de parto sem dor, e novamente, onde há sorrisos existem lágrimas: foi publicado o livro sob a égide de um ateliê de auto-edição, que o juízo apressado confunde com uma vanity press. Mas aqui comparamos formigas com baratas: as primeiras, obreiras, constroem sozinhas e com bastante esforço um habitat complexo, colectivo; as segundas, escondem-se, furtivas, espalhando doenças, contaminando, fingindo o que não são, proibindo (há quem diga quem lá publicou) de contar o que acontece atrás da porta fechada. Note-se que detalhar pacotes de serviços base e respectivo preçário é uma tentativa de caminhar para a luz, ao mesmo tempo que expõe a triste realidade de um mercado onde há mais autores que leitores, e os leitores que há correm para a escrita importada, vazio de oficinas de escrita profissionais e de uma verdadeira cultura de massa na qual o povo se reveja. Embora também seja necessário ressalvar que, quando se professa a doutrina de pecadores, escolher batina branca não garante absolvição do pecado original, pois o mero uso da batina arrisca-se a ofuscar as melhores das intenções - não se confunda este enquadramento com uma defesa da prática, como um todo.

Assim sendo, e por decisão editorial, o livro dificilmente se encontrará por acaso no mundo das pessoas, embora exista, e possa ser encomendado, apreciado, via mundo dos dedos (vulgo: digital). Deixo-vos com a sinopse oficial e as tais ligações para ir ao seu encontro, quais mapas de tesouros há muito por descobrir.

É dia de Festival na Cidade da Carne. Vindos do espaço virtual da GalxMente, milhares de Padrões escolhem corpos para encarnar e apreciar os imensos prazeres do mundo físico, discutir arte, assistir ao espectáculo de encerramento com os artistas humanos por eles concebidos. Estes artistas nasceram com doenças e deformidades propositadas, para falarem da morte e da angústia existencial - sensações negadas, e portanto cobiçadas, pela sociedade de imortais. Com sorte, talvez um artista morra em palco para deleite dos seus criadores… Acrescente-se a ameaça de ataque por um grupo de rebeldes, também humanos, com real perigo físico, e tudo se conjuga para uma experiência única e um dia inesquecível. Um dia que promete ficar na memória da GalxMente e fazer ascender os organizadores em estatuto pessoal.

Mas algo podre e funesto cresce nesta sociedade perfeita… E, ao terminar o dia, a GalxMente defrontará uma revelação capaz de abalar os seus princípios, que a vai conduzir numa guerra devastadora contra inimigos internos e externos.

Wook / Bertrand / Bulhosa / Fnac

 

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