Conceito de Luís Filipe Silva

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Dan Simmons: Illium e Olympos

Ricardo Loureiro -  Crítica |  16 Out 2006

Que nenhum dos humanos estranhe a presença de um herói da Ilíada no seio deles parece ser fruto do facto de durante quase dez anos seguirem a guerra de Tróia nos trapos de Turin, pequenos tecidos com microcircuitos que se colocam na face e dão algo muito semelhante a uma experiência de realidade virtual. Pouco tempo depois do encontro com Odisseus, Harman, Daeman e Savi viajam até ao anel equatorial onde descobrem uma macabra realidade. Aquilo que pensavam serem as habitações dos pós-humanos estão desertas e apenas Caliban ali vive, alimentando-se de carne humana. Separados de Savi, Harman e Daeman têm de sobreviver num ambiente desconhecido, até encontrarem o avatar da logosfera, Próspero, que lhes porporciona o conhecimento necessário para escaparem do anel e consequentemente de Caliban.

Não satisfeito com estas duas linhas narrativas, Simmons apresenta-nos ainda Mahnmut e Orphu de Io, dois moravecs que trabalham nas Luas de Júpiter. Providos de ADN humano nas partes orgânicas e complementados por partes mecânicas os moravecs têm um profundo interesse pela cultura humana, sendo Mahnmut um apreciador dos sonetos de Shakespeare enquanto Orphu se delicia com as nuances de Proust na obra-prima À la Recherche du Temps Perdu.

Convocados para uma reunião de emergência ambos em breve partirão numa expedição com o fim de descobrir o porquê da instabilidade quântica que ameaça a integridade do sistema solar e que aparentemente tem a sua origem em Olympos Mons em Marte. De todas as personagens do livro estas são as que, curiosamente, mais humanas me pareceram, porque além de terem um peculiar sentido de humor e passarem o tempo a citar obras literárias e outras da cultura popular do século XX e anteriores têm diálogos que, paradoxalmente, são dos mais contemporâneos. Acredito que tenha sido uma opção de Simmons para, de alguma forma, contextualizar o leitor dabdo-lhe uma alavanca para entender a narrativa. Não é por acaso que a maior parte das revelações dos variados enigmas surge na voz de Orphu de Io.

Como seria de esperar a viagem até Marte não corre da melhor forma possível e subitamente os dois moravecs vêem-se literalmente naufragados sendo salvos por uns misteriosos seres verdes cuja única missão na vida parece ser a de erigirem uns gigantescos bustos na orla do mar e nos intervalos agirem como bons samaritanos.

Simmons é um mestre na arte de mostrar ao invés de contar. A certa altura uma das personagens é fatalmente atacada por um alossauro para no capítulo seguinte surgir de novo sã e salva. Estes vislumbres de factos que o leitor desconhece mas com que as personagens estão familiarizadas visto lidarem com elas no seu quotidiano é uma óptima técnica narrativa muito mais eficaz do que o tradicional despejar de informação, técnica usada por escritores mais preguiçosos e que normalmente começa por sentar todos ao redor duma mesa a contarem pormenores que supostamente todos deveriam conhecer.

Entretanto tantalizantes pistas vão sendo semeadas ao longo do romance criando no leitor uma vontade de prosseguir mais que não seja para averiguar se a sua teoria sobre o que de facto está a acontecer bate certo ou não. Ilium termina num momento de tensão, vulgo cliffhanger, que só veria a resolução com a publicação em 2005 de Olympos.

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(c) Autor do Texto, (c) Luís Filipe Silva, 2003/2007. Não é permitida a reprodução não autorizada dos conteúdos.

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Autor:
Ricardo Loureiro