13 Junho 2008
SOMOS A GERAÇÃO INTERMÉDIA. O autor deste artigo exprime preocupações sobre a forma como a internet e a disponibilidade imediata de informação relativa a qualquer assunto alterou a forma de lermos, aprendermos e trabalharmos o texto. Resumidamente, que a natureza livre e múltipla da internet distrai a atenção, torna os métodos de escrita irrequietos, obriga-nos a procurar o próximo e-mail, o próximo artigo, e no entanto, quando o encontramos, limitamo-nos a passar os olhos sem realmente "ler com profundidade".Revejo-me em algumas dessas preocupações mas não em todas. Na minha perspectiva, creio que sucede o paradigma do vício da viagem: defrontado com a opção de encruzilhada após encruzilhada sucessiva, podendo atingir o destino qualquer que seja a opção escolhida, o acto de viajar torna-se tão interessante (ou mais ainda) que chegar onde se pretende ir, e o que teria sido um breve percurso torna-se numa errância eterna. Sabemos que o mundo na ponta dos dedos é infinito e não conseguimos coibir-nos de ir um pouco mais além, mais uma página, mais um acesso, como se nesse vôo infinito conseguíssemos obter a totalidade do conhecimento humano (algo a que poderia chamar de Síndrome do Conde de Monte-Cristo - fechado na prisão, absorvendo o conhecimento da espécie humana resumido em 150 livros...). E contudo, há sempre um conjunto de páginas, websites, a que retornamos, vez e outra, confirmando a sentença (já não me lembro de que autor) que a espécie humana "pertence, efectivamente, a espaços pequenos".
Outra questão se prende aqui, supostamente: que a percepção do valor de um texto é mais rigorosa. A qualidade dos artigos, das notícias e das entradas nos blogues está imbuída de uma falta de rigor e de uma permissividade de discurso pouco apelativa à leitura profunda a que o autor se refere. A culpa não é do meio (e daí, por ser tão fácil publicar, talvez seja), mas essencialmente de quem o usa, e usa mal. É muito inferior a qualidade e a relevância da escrita na internet que a da forma impressa. Tratar-se de uma plataforma universal que ostenta textos e os disponibiliza mundialmente com custo quase nulo impele a que seja utilizada com natureza conversacional. A dificuldade de publicação que ainda caracteriza a forma impressa, quer devido a custos quer devido à imposição dos editores, continua a servir de filtro importante para manter a coerência dos critérios de escolha (e daí, a facilidade de acesso a novos e mais económicos meios de impressão reflectem uma tendência semelhante à da internet). O estilo genérico do que se lê online é de quem mantém uma conversa oral, de quem intervém com um comentário, uma observação espontânea mas não necessariamente aprofundada. À grande maioria dos artigos falta ritmo, progresso, discurso, estrutura. São feitos por escritores em regime freelancer em torno de palavras-chave para manter a atenção dos motores de pesquisa nos sites para quem trabalham, e pagos miseravelmente a poucos dólares por conjuntos de 300 ou 500 palavras. Quando há necessidade de produzir milhares de palavras por dia para ter um mínimo de rendimento, que vontade há de escrever decentemente? E assim se enche a internet de lixo. E assim baixa a qualidade média dos textos. E assim não é de espantar que a atenção vagueie, que não se leia mas se passe os olhos por cima. O cérebro procura informação nova e genuína, e se o autor não reflectiu sobre o que escreve, porque haveria o leitor de o fazer?
E também há o seguinte: somos a geração intermédia. Somos o saco de pancada que está a ser posto à prova com as novas tecnologias. Aprendemos a brincar em carrinhos de madeira com rodas, com piões, com berlindes. Os nossos filhos organizam estruturas sociais no mundo virtual com participação de elementos de todo o mundo. É um admirável mundo novo.