Exposição Prolongada à Ficção Científica  

   um blog de Luís Filipe Silva


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21 Março 2009

E Pronto! Após tanto tempo na sua companhia, entreguei finalmente a tradução de Jack Faust à Saída de Emergência. Seguirá agora os ditames habituais de qualquer publicação, e logo que haja capa apresenta-la-ei neste espaço. O esforço desta tradução aliou-se ao prazer de trabalhar um texto importante, diria mesmo imprescindível nestes tempos de perigoso desequilíbrio entre as forças do raciocínio e as forças da estupidificação mística. O pressuposto especulativo que esteve por base desta obra é tão simples que causa assombro: e se o século XVI tivesse sido de repente presenteado com todo o conhecimento científico, tecnológico e industrial dos séculos seguintes? Quatrocentos anos subitamente condensados no espaço de poucas gerações, impondo-se sobre uma sociedade inculta, embrutecida pela doença, pela miséria, pelo obscurantismo de uma ditadura religiosa do pensamento. Como conciliar a clareza do método científico com o torpor da crença em textos clássicos e medievais, que desdenhavam a observação e a medição cuidada ante o mais confortável e menos trabalhoso método da derivação filosófica? Como, efectivamente, impelir a mudança - que homem, que agente se predisporia a tal?

Nada menos que o próprio Fausto.

Fausto aqui surge em plenas vestes que Marlowe e Goethe e Mann lhe vestiram: o grande arrogante, hipócrita, escudando-se na defesa de uma Verdade absoluta que a humanidade merecia conhecer para alcançar o íntimo propósito da sua alma, que nas páginas finais o autor descreve tão bem, ao fazer Fausto admitir que considerava Cristo o seu principal rival. Vendendo a alma em troca do pleno conhecimento - um bom negócio, bem vistas as coisas, ante o pouco valor de tal alma. Mefistófeles torna-se assim, não num agente de moralidade ou de corrupção, mas num mero facilitador, alguém que passa o fósforo e a gasolina ao incendiário e a seguir senta-se a apreciar. Neste caso, o fósforo sendo a ciência e a gasolina a tecnologia - além de uns apartes sobre o íntimo humano e outros considerandos. Fausto torna-se omnisciente, para todos os efeitos, soberbamente inteligente - mas não necessariamente esperto. Nem preocupado com as consequências da sua vontade, aparte a satisfação mimada da sua vontade de destaque.

Um tema desta magnitude é tratado com extraordinária economia por Michael Swanwick, dizendo e mostrando somente o que lhe parece relevante, para que possamos inferir o resto. Ao contrário da imponência orquestral das versões clássicas acima mencionadas, Swanwick optou por uma abordagem de farsa, um diorama de acontecimentos e divagações que conduzem a uma conclusão trágica e infelizmente credível. É um texto dramático escondido na forma de um romance, uma peça de morais e costumes com as cores da história alternativa. Ou da fantasia. Ou da ficção científica. Ou de todas em conjunto, afinal, pois na verdade este é um romance dificilmente categorizável - um dos principais indícios das grandes obras.

Num ano de colecção Bang! que verá a continuação do sucesso de Anne Bishop e George Martin, este desconhecido título corre o risco de passar despercebido pelos leitores. Espero que tal não venha a acontecer. Para o bem das vossas almas perenes...

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19 Março 2009

Ontem Debateu-se A Vida E Obra de um dos grandes clássicos americanos do século XIX, um dos poucos autores dessa época que conseguiu transceder os tempos e quase duzentos anos passados sobre as suas obras ainda é lido com prazer e continua a conquistar mercados (mais, eventualmente, do que terá sucedido na sua própria época), ombreando sem dificuldade com autores contemporâneos e temas da actualidade. Tal é a marca do génio. Esmiuçado ao longo das eras ao ínfimo pormenor por volumes e volumes de críticas (atrever-me-ia a dizer, bibliotecas de criticas), continua a ser importante relembrar o autor e as peculiaridades das suas influências nas gerações que o seguiram. Edgar Allan Poe chegou a Lisboa é a «vítima» feliz de um conjunto de debates que ontem começou («Poe e a Criatividade Gótica») e sexta-feira terminará, organizados pelo Centro de Estudos Anglísticos da Universidade de Lisboa e que têm lugar na Faculdade de Letras da mesma universidade.

Tive ontem o prazer de estar sentado ao lado do David Soares e da Hélia Correia num debate moderado pelo Pedro Mexia (que, exemplar no seu papel, deu voz plena aos autores, não contribuindo com as suas opiniões, o que foi uma pena - gostaria que me tivesse ocorrido incitá-lo também a participar). Fica aqui o meu especial agradecimento aos organizadores do evento, não só pela minha inclusão como pelo reconhecimento da importância da Ficção Científica para este tema, e muito em particular, à Margarida Vale de Gato, que me convidou pessoalmente; a Margarida traduziu a Obra Poética Completa de Poe, um magnífico volume em capa dura com ilustrações fantasmagórias de Filipe Abranches editado recentemente pela Tinta da China, que vos incito a descobrir. Obrigado também a todos os que compareceram e que nos acompanharam no jantar de convívio a seguir.

Poe é um novelo que incita ao pensamento e que parece nunca terminar; a sua postura literária, e a sua postura sobre a sua postura literária, conduzem a interpretações diversas e a interrogações que nunca terão uma resposta efectiva. Os grandes autores nunca respondem na totalidade às perguntas que colocam.

O prazer está em colocar as perguntas e discutir as possíveis alternativas. Hoje há mais - compareçam.

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