Conceito de Luís Filipe Silva

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Noveleta

 

Fim de Semana em Paris

 

Jorge Candeias

 

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- Para que trazes tu isso?

Ela fitou-o. Parecia dizer-lhe não tens nada com isso. Ou porque sim. Ou qualquer outra dessas frases rebeldes. Suspirou. Olhou a caixa do linque e passou-lhe a mão num afago distraído.

- Porque tu vais estar numa reunião e eu fico sozinha. - acabou por dizer.

- A reunião dura duas horas, que diabo! Não me digas que não tens maneira de encher duas horas em Paris?!

Ela fitou-o de novo. Pôs olhos trocistas para perguntar:

- E com que encho eu essas duas horas, sabichão?

Ele começou a gesticular.

- Há cafés em Paris, há montras! Tu falas francês, podes meter conversa, conhecer gente! E mesmo que não falasses! Há lá portugueses aos montes! Há sessões de cinema, há passeios onde se pode simplesmente passear! Há jardins e até há pombos nos jardins, como cá! Há pão à venda também e se calhar perto dos jardins! Passas a vida a dar pão aos pombos de cá, não vejo porque não hás-de dar também algum aos pombos de lá! Que necessidade tens tu de vir com o linque atrás?

Ela fez um gesto de exasperação.

- Chiça, José! Que embirração com o aparelho! Tens alguma coisa contra ele? Que coisa! Que chato!

Ele respirou fundo para não confessar Odeio essa merda. Engoliu a custo as três palavras que lhe brincavam na ponta da língua, chamando pela voz. Ficaram-lhe algum tempo atravessadas na garganta dando-lhe nós, atando-a e desatando-a. Começava a ficar furioso, e essa era a melhor maneira que conhecia para estragar um fim de semana. Em Paris ou na Reboleira. Principalmente porque se conhecia. Sabia dos perigos encerrados na sua fúria. Já abrira algumas vezes essa sua caixa de Pandora privativa. E já tivera a sua dose de dissabores.


Nada que gostasse de recordar, se bem que a recordação viesse sem ser chamada de tempos a tempos. Era assim como um aviso, um sinal de perigo à beira da estrada. Como se lhe dissesse Perigo. Estrada escorregadia, com lombas e buracos. Precipício mais à frente.

Melhor parar com aquilo.

Olhou para ela, pequenina na sua frente, olhando-o sem expressão. Parecia uma coisinha frágil, capaz de partir-se com um sopro. Mas enganava. Ele conhecia-lhe a força e os jeitos de ser. Lembrou-se do corpo esguio, e de como esse corpo se abria para si duma forma que lhe lembrava sempre pétalas de rosa. Até cheirava a pétalas de rosa. Olhou-lhe o rosto moreno e depois para o relógio. Encolheu os ombros.

- OK, esquece. Traz lá essa porcaria. Tens tudo? Não te esqueceste de nada?

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Autor:
Jorge Candeias